Festival Literário: o foco em Sophia, Whitman e patuá

Fotografia: Eduardo Martins

É sob o signo da poesia, de Sophia de Mello Breyner Andresen, Jorge de Sena, Adé dos Santos Ferreira, Walt Whitman e Herman Melville que se realiza a oitava edição do Festival Literário Rota das Letras. Por Macau vão passar José Luís Peixoto, Miguel Sousa Tavares, Pedro Lamares, Eduardo Pacheco, Hirondina Joshua, José Luís Tavares e Jidi Majia, por exemplo. “O festival literário pode ser a cola que une toda a gente através, desta vez, da poesia”, explicou a directora executiva, Alice Kok.

André Vinagre

andrevinagre.pontofinal@gmail.com

Tem início na próxima sexta-feira a oitava edição do Festival Literário de Macau – Rota das Letras. Ontem, em conferência de imprensa, foram apresentados os detalhes sobre o festival que, pela primeira vez, se foca na poesia. Poetas portugueses, chineses, de Macau e dos vários países de língua portuguesa vão falar sobre as suas obras e sobre o papel da poesia enquanto forma de expressão artística. “Com a poesia é fácil criar pontes entre as pessoas, pontes bonitas”, afirmou Carlos Morais José, director de programação. O festival acontece entre 15 e 24 de Março.

Naquele que é o ano do centésimo aniversário de Sophia de Mello Breyner Andresen, o Festival Literário Rota das Letras preparou uma homenagem à escritora. Assim, o festival convidou Miguel Sousa Tavares, escritor e jornalista, filho da autora, para um painel onde estarão presentes também David Brookshaw, investigador e tradutor de vários autores lusófonos, e Yao Feng, director do Departamento de Português da Universidade de Macau e tradutor de várias obras de Sophia de Mello Breyner. A sessão, que se centrará no percurso literário de Sophia, começa às 19 horas do primeiro dia do festival, 15 de Março, nas Oficinas Navais n.º1. “Vai ser possível ouvir os poemas de Sophia em português, pelo seu filho, em chinês, pelo professor Yao Feng, e em inglês, por David Brookshaw”, indicou Ricardo Pinto, director do Rota das Letras, na conferência de imprensa de apresentação do festival.

Depois do painel, há lugar à peça de teatro “Sophia”, desta vez nas Oficinas Navais n.º2, pelas 21 horas. A dramaturgia baseada em poemas de Sophia de Mello Breyner Andresen é produzida pela associação cultural D’As Entranhas. Esta peça “vai falar sobre relações, homens, mulheres, Deuses, Terra”, descreveu Vera Paz.

No dia 21 de Março, Adélia Carvalho, autora de livros para crianças, distinguida em 2017 na China com o prémio Little Hakka com o livro “O Homem da Mala”, vai apresentar uma biografia para crianças da escritora que é uma das protagonistas desta edição do Rota das Letras. “Sophia, a Menina da Terra e do Mar” acontece na Livraria Portuguesa pelas 18h30.

Já fora do âmbito de Sophia de Mello Breyner, Miguel Sousa Tavares vai estar presente numa outra sessão, dia 17, pelas 17h15, nas Oficinas Navais n.º1, onde vai falar sobre os seus livros e as suas viagens. Miguel Sousa Tavares é autor de “Equador”, “Rio das Flores” e “No Teu Deserto”, por exemplo.

Também o poeta Jorge de Sena faria, em 2019, 100 anos, e também ele será homenageado no Festival Literário de Macau. “Dos Estados Unidos vem um professor que trabalhava com Jorge de Sena e vem mostrar um documentário que fez” sobre o autor português, avançou Ricardo Pinto. “Recordar Jorge de Sena”, de Frederick G. Williams, é o filme que será exibido no dia 19 de Março, pelas 19h30, no auditório do Consulado de Portugal. O norte-americano, que foi colega de Jorge de Sena na Universidade da Califórnia, em Santa Barbara, doutorou-se na Universidade de Wisconsin com um trabalho sobre o escritor português. Além disso, o professor que leccionou Literatura em Língua Portuguesa também na Universidade da Califórnia, fundou o Centro Jorge de Sena para os estudos portugueses.

Por sua vez, 2019 é também o bicentenário do nascimento dos escritores norte-americanos Walt Whitman e Herman Melville. Para celebrar Melville, o Rota das Letras vai exibir “Melville in Love: Uma biografia do autor de Moby Dick”, de 2018, realizada por Seth Newton e escrita por Michael Shelden. O filme será exibido pelas 18h30 do dia 18 de Março, no auditório do consulado português. No dia seguinte, às 21h30, é a vez de os 200 anos de Walt Whitman serem assinalados pelo Rota das Letras, também através de um documentário que, neste caso, será exibido na Cinemateca Paixão, intitulado “Whitman, Alabama”, de Jennifer Crandall. Durante dois anos, a realizadora percorreu o Alabama filmando diferentes pessoas a dizerem os versos de “Song of Myself”, do poeta agora homenageado.

 

JOSÉ LUÍS PEIXOTO TRADUZ JIDI MAJIA

 

Por Macau vai passar também José Luís Peixoto. O escritor português vai lançar uma tradução para português de uma obra do poeta chinês Jidi Majia, vice-presidente da Associação de Escritores da China, “Palavras de Fogo”. Ambos vão participar numa sessão, que conta ainda com o professor Yao Feng, no dia 16 de Março, pelas 16h30, nas Oficinas Navais n.º2. No mesmo dia, às 18h15, José Luís Tavares participa num outro painel, onde se incluem também a escritora moçambicana Hirondina Joshua e ainda o cabo-verdiano José Luiz Tavares. Os três participam no painel “Poeta, Poema, Poesia – Do Acto de Escrita ao Corpus Literário”.

No dia seguinte, José Luís Peixoto participa numa récita de poesia, juntamente com José Luiz Tavares, Hirondina Joshua e os autores chineses Na Ye, Shu Yu, Tan Wuchang, Wei Ming e ainda Chris Song, de Hong Kong. A récita acontece nas Oficinas Navais n.º2, às 18h30. Já no dia 19, o autor de “Nenhum Olhar” e “Galveias” junta-se a Frederick G. Williams e à tradutora, investigadora e professora de língua e literatura portuguesa Patrícia Jin Xinyi para uma sessão sobre tradução da literatura lusófona, às 18h15 no Instituto Português do Oriente (IPOR).

POESIA MACAENSE EM DESTAQUE

 

No dia 20, às 19h30, no Albergue SCM, realiza-se uma récita de poesia maquista pelo grupo de teatro Doci Papiaçám di Macau, em homenagem ao poeta Adé dos Santos Ferreira. “Vamos ouvir poesia macaense em patuá, um evento muito raro”, descreveu Carlos Morais José, acrescentando que a organização tem “muito orgulho neste momento”. Miguel de Senna Fernandes, dramaturgo e director da companhia de teatro, referiu que “o Festival Rota das Letras fez um grande trabalho ao apostar nesta homenagem”. “Adé era um poeta, um escritor e um homem de palco”, descreveu.

Miguel de Senna Fernandes vai ainda recitar um poema de sua autoria, escrito “há alguns anos”, explicou depois da conferência. “É um poema que vai ser publicado agora. É um poema de amor. Achei que é sempre bonito porque a poesia resume o estado da alma, é o estado da alma que está aqui em causa”, disse. Chama-se “Lágrimas de Amor”, contou ao PONTO FINAL, indicando: “Como é uma homenagem à poesia, aproveitei para apresentar uma coisa minha em tributo ao Adé dos Santos Ferreira”.

Também nessa quarta-feira, será lançado o Dicionário do Crioulo de Macau, por Carlos Marreiros e Raul Leal Gaião. O lançamento do dicionário de patuá acontece no albergue SCM pelas 18h30.

Esta edição do Festival Rota das Letras vai apresentar ainda o espectáculo de Pedro Lamares em que o actor e ‘diseur’ recita “Ode Marítima”, poema de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa. Esta é, diz a organização, a primeira vez que a “Ode Marítima” será dita em Macau na sua versão integral. O espectáculo acontece no dia 23 de Março, pelas 21 horas, no Teatro D. Pedro V.

Até ao momento, há dois workshops confirmados, adiantou Alice Kok ao PONTO FINAL. “Uma ilustradora chinesa que vem dar um workshop sobre gravura em madeira, provavelmente no Art Garden”, e ainda “um outro workshop de um poeta de Taiwan que será sobre poesia, mas com muito humor”. Neste workshop, explicou a directora executiva, será possível aprender como é que “escrever poesia melhora a saúde”.

“Tentámos montar um programa tão bom como nos anos anteriores”, referiu Ricardo Pinto durante a apresentação do festival. Carlos Morais José explicou o porquê de o tema principal ser a poesia: “Decidimos começar pela poesia porque a poesia é o início de tudo”. “Não há civilização sem poesia. Porquê? Porque é através da poesia que pomos as pessoas a comunicar”, referiu, concluindo: “Com a poesia é fácil criar pontes entre as pessoas, pontes bonitas, não são pontes feias”.

Ideia semelhante passou Alice Kok: “Isto funciona como cola entre as diferentes comunidades. Porque em Macau é muito complexo, temos a comunidade chinesa, a comunidade portuguesa, a comunidade que fala inglês e muitas outras comunidades dentro da sociedade. E usamos todos línguas diferentes. E o Festival Literário pode ser a cola que une toda a gente através, desta vez, da poesia”.

 

Salvador, Pessanha e marionetas, no palco do Rota das Letras

Salvador Sobral, vencedor do Festival da Eurovisão da Canção em 2017, vai actuar no Broadway Theatre no dia 17 de Março. O músico português, acompanhado por Júlio Resende, André Rosinha e Bruno Pedroso, vem a Macau apresentar o seu segundo disco “Paris-Lisboa” a convite do Festival Literário Macau. O concerto está marcado para as 21 horas. A festa de encerramento do Rota das Letras vai fazer-se ao som dos Wednesday & Bad to the Bone. A banda de Taipé, Taiwan, que vai do blues ao pós-punk, actua no Live Music Association (LMA) pelas 22h30 do dia 24 de Março. Além da literatura e da música, também o teatro e o cinema vão fazer parte do festival literário: às 14h30 do dia 24 será exibido nas Oficinas Navais o filme interactivo “Cavadre Exquis”, de Bruno Mendes da Silva. Já “Pe San Ié”, de Rosa Coutinho Cabral, sobre o poeta Camilo Pessanha, será mostrado na Cinemateca Paixão no dia 22 às 21 horas. Há ainda lugar para “Nobody Nose”, um filme de Kong Rui Liang, sobre três escritores de Macau, que estará em exibição às 21 horas de dia 16 no Cinema Alegria.  “Hotel Império”, de Ivo M. Ferreira, também estará em exibição no Cinema Alegria, dia 20, às 21 horas. No teatro, a peça “Droga”, uma adaptação do romance homónimo de Lu Xun, será apresentada de 22 a 24 de Março nas Oficinas Navais n.º2. A peça, apresentada pela Companhia de Teatro Alternativo Rolling Puppet, é interpretada com recurso a marionetas e fantoches. A.V.

 

José Luís Peixoto na UM para conduzir oficina de escrita

O escritor português José Luís Peixoto está, a partir de hoje e até à próxima quinta-feira, no Centro de Ensino e Formação Bilingue Chinês-Português do Departamento de Português da Universidade de Macau (UM) para dirigir uma oficina de escrita de ficção literária. A oficina de escrita, intitulada “As Histórias que Temos Para Contar”, será estruturada em quatro sessões que decorrem entre as 15 horas e as 17h30. Em comunicado divulgado na passada sexta-feira, a UM explica que esta oficina de escrita tem como objectivo fazer com que os participantes desenvolvam um texto literário, compreendendo a estrutura, criatividade e métodos envolvidos no processo de criação. A UM acrescenta que as sessões se destinam a todos os interessados que tenham um bom domínio escrito e oral do português, já que os encontros serão conduzidos em língua portuguesa. José Luís Peixoto é autor de dez obras de ficção, três de poesia, duas de literatura de viagem e dois livros infantis. O escritor português, que estará presente também no Festival Literário de Macau – Rota das Letras, venceu em 2001 o Prémio Literário José Saramago com “Nenhum Olhar”. A sua obra está traduzida em 25 línguas. A.V.

 

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