O pescador, o homem de negócios e a amante num filme de Maxim Bessmertny

“Sampan” é o título, ainda provisório, da nova curta-metragem de Maxim Bessmertny, filmado em 16 mm, no mar ao largo dos Novos Territórios em Hong Kong. O realizador de Macau juntou-se à nova tendência do cinema independente internacional e filmou em película cinematográfica analógica. O realizador está em Los Angeles a acompanhar a pós-produção do filme.

Max 2

Cláudia Aranda

“Sempre quis fazer uma história envolvendo um pescador e o mar”, disse Maxim Bessmertny em declarações ao PONTO FINAL, fazendo referência à obra de ficção de Ernest Hemingway “The Old Man and The Sea” (“O Velho e o Mar”), publicado em 1952. O livro narra uma história de luta e de perseverança, que inspirou já tantas outras histórias.

Falando desde Los Angeles, Bessmertny, de 28 anos, explicou que “Sampan” – título provisório, por enquanto – começou por ser uma coisa e acabou por se transformar em algo completamente diferente: um pescador, um homem de negócios e a sua amante ficam presos nas águas de Sai Kung, nos Novos territórios, em Hong Kong. “Queria explorar esta situação e trabalhar os personagens”, diz o autor de “Tricycle Thief” (“Ladrão de Riquexós”), seleccionado para o Festival Internacional de Cinema de Toronto de 2014 e que estreou no mesmo ano em Macau.

Bessmertny encontra-se a terminar o mestrado em cinema na NYU Tisch School of the Arts Asia, em Singapura, e conta “Sampan” (ou sampana, que significa barco de pesca ou de transporte), foi o argumento cinematográfico escrito para a tese de mestrado na Tisch. O autor já realizou este ano outras duas curta-metragens  – “The Great Debt” e “A Critical Lunch” – como preparação para “Sampan”.

A produção desta curta foi mais complexa, contou com uma equipa de filmagens de 15 elementos e resultou numa empreitada, descrita por Bessmertny, “como a mais difícil que realizou até agora”: “Talvez para muitos da equipa também. Mas, é uma boa sensação. Cada projecto apresenta os seus próprios desafios”, disse o jovem realizador russo.

Durante as filmagens a equipa teve que enfrentar uma série de obstáculos impostos pelas circunstâncias das filmagens: “O cinema narrativo é poder controlar o que nós vemos e ouvimos”, explicou o realizador. Mas, neste caso, “havia navios ao fundo, barcos de recreio a passarem ao lado, o ruído de aviões, do vento, cenários que se deslocavam por estarmos a filmar num barco dentro de água, sempre em movimento, ou seja, ora havia montanhas como pano de fundo, ora não havia, então tínhamos que girar o barco”, descreve o autor. Tudo isto para não mencionar as condições do tempo, ora desfazendo-se em chuva e trovões, ora abrindo com um sol fortíssimo, seguido de céu nublado.

 

Usar película para captar a nostalgia

 

Bessemertny elogia a equipa de profissionais com que trabalhou e que foi capaz de se adaptar às circunstâncias inesperadas: “Foi realmente muito difícil. Tínhamos que dar 300 por cento, das seis horas da manhã às seis da tarde, caso contrário, não conseguíamos terminar a história que tinha a intenção de filmar”. O tempo de filmagem era muito limitado. Só as viagens de ida e volta para os locais de gravação consumiam três horas por dia. Cada cena era ensaiada antes de ser gravada, daí que, para as filmagens restavam normalmente apenas umas cinco horas de luz.

Para Bessmertny os momentos mais serenos eram quando navegavam de regresso a Sai Kung, à noite, num barco de madeira: “Havia material mais do que suficiente para um documentário sobre a natureza, o aquecimento global e sobre o que fica ‘lost on translation’”, ou seja, perdido, sem tradução.

A opção de filmar em película – numa época em que o digital prevalece sobre as tecnologias analógicas – relacionou-se com questões estéticas e práticas. Maxim Bessmertny explica que com o filme “Tricycle Thief” ganhou o prémio Kodak Gold Award de 2015, que lhe valeu um patrocínio em película: “Eu e o director de fotografia, Jordan Quellman, que também trabalhou no ‘Tricycle Thief’, decidimos usar película de cor de 16mm porque a história passa-se à luz do dia exterior e queríamos captar a nostalgia das paisagens rochosas que cercam as águas de Hong Kong. Gostei de usar película porque parece cinema indie dos anos 1970, daí que decidimos avançar”, explica.

O projecto recebeu um novo empurrão para se concretizar em película quando uma das grandes casas de aluguer de equipamento cinematográfico nos EUA aceitou ajudar a equipa emprestando uma câmara “Arri 416”, “que é a melhor câmara de 16mm que existe, utilizada em filmes como ‘Black Swan’, ‘Fruitvale Station’ ou ‘The Walking Dead’”, explicou Bessmertny. A empresa norte-americana forneceu ainda, “quase de graça” lentes anamórficas, que permitem criar imagens amplas, “wide-screen”, usadas nos anos 1950.

A opção por Los Angeles para o processo de pós-produção surgiu de forma natural. O realizador e director de fotografia já tinham feitos teste prévios em Los Angeles, da película, da câmara de filmar e das lentes: “Era lógico revelar o filme lá também, apesar de haver outros lugares onde é possível revelar filmes em película, talvez Pequim e Taipé. É o mesmo custo, mas não testei nesses lugares”, esclareceu o realizador.

Bessmertny acha que ainda é cedo para avançar com datas de estreia da nova curta-metragem em Macau e Hong Kong: “Talvez existam plataformas de distribuição on-line que possa testar desta vez”. No total o realizador já produziu pelo menos 13 curta-metragens independentes. Para esta produção Bessmertny contou com patrocínios do Governo e de privados. De outra forma “teria sido impossível concretizar o projecto”, sublinhou.

 

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