Agenda de ajudas em tempo de crise

Um pacote de seis medidas de apoio ao desenvolvimento foi o anúncio mais sonante e concreto do Fórum dos oito. Wen Jiabao prometeu fundos e novos mundos para as empresas e produtos chineses.

 

Maria Caetano

 

A cooperação sino-lusófona deve atingir, a nível do comércio, a fasquia de 100 mil milhões de dólares de trocas em 2013, e o investimento recíproco entre os oito membros do Fórum de Macau, criado há sete anos, deve ultrapassar um estado considerado ainda incipiente. Há que alargar áreas de cooperação, e reforçar o lugar de Macau nesta ligação económica e “amistosa”.

Os quatro objectivos para o próximo triénio foram ontem elencados pelo primeiro-ministro, Wen Jiabao, naquele que foi até aqui o encontro de mais alto nível a juntar dirigentes da China e dos países de língua portuguesa, com a presença de quatro líderes de Governo e um chefe de Estado.

Os grandes anúncios do 3º Encontro Ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa prenderam-se no entanto sobretudo com apoios ao desenvolvimento – dirigidos na sua maioria à África lusófona e a Timor-Leste –, nos quais Pequim estendeu a mão, e os parceiros agradeceram.

“Os oito irmãos deste fórum estão em fases diferentes de desenvolvimento. É nossa responsabilidade comum ajudar os países lusófonos a conseguirem maior desenvolvimento e a erradicarem a pobreza”, afirmou o primeiro-ministro chinês ao elencar um pacote de seis medidas que se traduzem, de uma forma simples, em ajudas sem contrapartidas declaradas.

 

“Perspectivas brilhantes”

 

Wen Jiabao anunciou a criação de um fundo de cooperação no valor de mil milhões de dólares norte-americanos (cerca de oito mil milhões de patacas), a ser canalizado através de instituições financeiras do Continente, como a primeira medida do lote. A segunda consistirá numa linha de crédito no valor de 1,6 mil milhões de yuan destinada a Moçambique, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau e Timor-Leste.

Os mesmos países irão receber materiais, equipamentos, pessoal técnico e outro tipo de apoio para um projecto de cooperação agrícola, e receber formação, que envolverá 1500 oficiais e técnicos. Pequim promete apoiar a RAEM no estabelecimento de um centro de formação para este fim.

Alunos dos membros africanos e asiáticos do fórum vão também poder aceder a mil bolsas destinadas àqueles que realizarem estudos na China, e, por fim, cada um dos cinco países irá receber equipamento médico e aparelhos no valor de 10 milhões de yuan com remetente de Pequim.

Trata-se, frisou o líder do Conselho de Estado, de “estreitar laços amigáveis”, entre economias que são também “altamente complementares”. “Os nossos interesses comuns não param de alargar e a necessidade mútua cresce também”, explicou, antevendo “perspectiva brilhantes” para uma cooperação comercial que tem vindo anualmente a exceder as metas previstas, ao nível do volume de trocas.

Porém, defendeu Wen Jiabao, é necessário “alargar ainda mais as áreas de cooperação, inovar os métodos e enriquecer o conteúdo da cooperação”, para que se alcance um “patamar ainda mais elevado”.

 

Potencialidades por explorar

 

Nos novos desígnios do Governo Central face aos seus parceiros lusófonos – com a meta estipulada em cem mil milhões de dólares (perto de oitocentos milhões de patacas) – há que expandir mercados, reduzir barreiras comerciais, reforçar a coordenação política e conjugar esforços contra o proteccionismo comercial, afirmou Wen, salientando aquilo que convém ao parceiro chinês.

Pequim dá prioridade à importação de produtos electromecânicos, à alta tecnologia e aos serviços dos países lusófonos, e promete por seu turno a concessão de taxa alfandegária ‘zero’ “para a grande maioria das mercadorias” compradas aos países africanos e a Timor-Leste.

Por outro lado, salientou, há que promover mais o investimento entre as partes. “Não conseguimos aproveitar de forma plena as potencialidades de investimento entre as duas partes”, diagnosticou sobre aquela que parece ser a maior falha na cooperação. A receita para inverter o cenário consiste em afinar legislações, e promover tratados bilaterais para protecção de investimento e evitar a dupla tributação.

Há ainda que encorajar as pequenas e médias empresas chinesas a cooperarem e investirem em território da lusofonia. “As empresas chinesas são experientes na construção de projectos de infra-estruturas, enquanto os países lusófonos têm grande mercado. Isto pode ser uma área de novo desenvolvimento da nossa cooperação”, defendeu.

O alargamento da cooperação é outro dos objectivos a perseguir até 2013. O primeiro-ministro afirmou que esta “não deve ser limitada a áreas tradicionais”, como comércio, recursos humanos ou infra-estruturas. Os sectores de turismo e financeiro devem ser aposta.

“A China vai promover recursos de turismo de países lusófonos e apoiá-los para que obtenham o estatuto de destino aprovado para turistas chineses”, avançou Wen, apelando à criação de mais ligações aéreas directas entre os parceiros do Fórum e a melhorias nas redes logísticas.

Na área financeira, Pequim põe a tónica no intercâmbio entre bancos centrais e autoridades reguladoras e fala em “encorajar o estabelecimento de filiais dos bancos em cada um dos países em tempo oportuno”.

À atenção do Governo da RAEM ficou a ideia de que Macau deve continuar a potenciar, por via do Fórum, as suas vantagens: ser ponto de encontro entre Oriente e Ocidente, ter infra-estruturas “perfeitas”, “um sistema sofisticado dos serviços financeiros”, “um ambiente livre e aberto de negócios”, bem como uma reserva de profissionais bilingues. Só há que “continuar a aproveitar bem esta plataforma”.

 

Comércio continua a ser indicador mais revelador da cooperação

 

“Hoje em dia, café, caju, vinho e outros produtos famosos provenientes dos países de língua portuguesa são servidos cada vez mais frequentemente na mesa das famílias chinesas. Enquanto mercadorias de qualidade, sem serem caras, provenientes da China, têm enriquecido os mercados dos países lusófonos.” Foi esta a imagem deixada por Wen Jiabao para ilustrar a dimensão que o Fórum de Macau atinge nos consumos dos mercados que integra, sete anos após o seu estabelecimento.

O volume das trocas comerciais continua a ser o principal indicador, atingindo este ano, até Setembro, um valor de 68,2 mil milhões de dólares, com um crescimento de 57 por cento face ao período homólogo do ano passado.

O primeiro-ministro chinês recordou que, em 2003, o fluxo comercial entre as duas partes registava pouco mais que dez mil milhões de dólares norte-americanos.

Já os dados do investimento directo apontam para existência de 700 empresas de países língua portuguesa a operarem na China, numa canalização de fundos superior a 500 milhões de dólares norte-americanos. O volume acumulado do investimento de Pequim nestes países mil milhões de dólares norte-americanos.

Os feitos ao nível do capítulo das ajudas foram evidenciados também por Wen Jiabao, que contabilizou a assistência da China a países lusófonos em vias de desenvolvimento em 3,56 mil milhões de dólares desde 2003. Pequim cancelou ainda débitos no valor de 230 milhões de yuan, associados com a linha de crédito governamental sem juros, avançou.

Projectos de infra-estruturas em Guiné-Bissau, Cabo Verde, Timor-Leste e Moçambique são outros dos “símbolos da amizade” sino-lusófona, bem como o desenvolvimento de recursos humanos, reforçado com mais de 200 cursos e seminários, que formaram 2100 oficiais e técnicos dos países lusófonos (1400, nos últimos três anos).

 

 

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