Quem não estiver bem que se mude

É esta a lógica de Shuen Ka Hung quando se fala em trabalhadores não residentes. Se a mão-de-obra importada se sente maltratada, tem bom remédio, considera o director da DSAL: o regresso às origens.

A legislação de Macau não assiste aos trabalhadores não residentes o direito de mudarem de emprego, uma questão contestada por muitos e que tem uma solução para o director para os Assuntos Laborais: o regresso às respectivas terras natais.

A lei de contratação de não residentes – sem direito à fixação de residência, dispondo de uma autorização de permanência na RAEM enquanto vigorar o contrato de trabalho – está em vigor há quatro meses, apesar da contestação dos imigrantes que se dizem discriminados.

A imposição de uma taxa mensal ao empregador por cada não residente contratado, para fins de segurança social, e a proibição de entrada em Macau, entre seis meses e dois anos, aos que virem cancelada a autorização de permanência (‘blue card’) ou que mudem de emprego estão no centro da contestação.

Em entrevista à Agência Lusa, o director dos Serviços para os Assuntos Laborais, Shuen Ka Ung, defendeu que a nova lei “já protege muito bem os direitos e deveres dos não residentes, que gozam dos mesmos direitos dos residentes, com excepção da liberdade de encontrarem emprego por eles próprios”.

Questionado sobre a possibilidade de o Executivo poder inverter, no futuro, essa posição, permitindo aos mais de 72 mil não residentes mudarem de emprego perante melhores ofertas de trabalho, o responsável disse: “Se o trabalhador acha que as condições que o empregador lhe oferece não são suficientes ou é maltratado, ele pode voltar à sua terra para tentar arranjar outro emprego.”

“Os trabalhadores locais têm prioridade no acesso ao emprego e o direito ao mesmo não pode ser prejudicado, sendo que a importação de trabalhadores não residentes só é considerada como complemento temporário e autorizada apenas em caso de inexistência ou insuficiência de trabalhadores residentes aptos a prestar trabalho”, defendeu o Gabinete de Recursos Humanos de Macau num e-mail enviado à Lusa.

A taxa de desemprego de Macau situa-se nos 2,9 por cento, ou seja, cerca de nove mil desempregados, a “maioria com idade mais avançada e baixas qualificações”, explicou Shuen Ka Ung, ao observar que, “em Macau, quase toda a população está empregada”.

A política de restrição à importação de mão de obra é explicada pelo Gabinete de Recursos Humanos “para equilibrar a procura e oferta dos recursos humanos, sem prejuízo das oportunidades ao emprego dos trabalhadores locais serem asseguradas”.

“A população empregada em Macau é de apenas 300 mil trabalhadores. Sente-se a falta de trabalhadores em alguns sectores, mas há empregadores que cometem erros na importação, por isso o importante é fiscalizar o processo”, acrescentou Shuen Ka Ung.

Perante as queixas das pequenas e grandes empresas sobre a dificuldade em contratarem trabalhadores, o responsável sugere que aquelas “melhorem as regalias oferecidas” e afasta a possibilidade de as restrições à importação de mão de obra serem o único factor do trabalho ilegal.

Salário mínimo e justiça

Na entrevista concedida à Agência Lusa, Shuen Ka Hung pronunciou-se ainda sobre a implementação do salário mínimo, reiterando a sua convicção de que, em 2011, patronato e trabalhadores poderão alcançar um “consenso básico” para se avançar com a medida – que poderá abranger os não residentes.

“Hong Kong vai implementar o salário mínimo e Macau vai ter como referência essa experiência”, disse o director dos Serviços para os Assuntos Laborais. “Depois há que ver se esse consenso permite avançar com a implementação do salário mínimo, pois é necessário metade dos votos do hemiciclo. Temos de conseguir ainda isso”, sustentou.

Shuen recordou que “os trabalhadores defendem um salário mínimo, mas o patronato acha que vai afectar o negócio”, para sustentar que “se o salário for muito baixo, não se conseguirá proteger os trabalhadores com mais dificuldades e se for muito elevado poderá ter um impacto negativo sobre as pequenas e médias empresas, com competitividade mais fraca, podendo, no extremo, provocar o seu encerramento”.

As 21 patacas por hora de salário mínimo pagas pelo Governo a trabalhadores de limpeza e segurança de serviços públicos “é um valor de referência adequado”, defendeu o responsável pela DSAL, admitindo no entanto eventuais “dificuldades dos empregadores para pagar aquele valor”.

Em Hong Kong, o salário mínimo não abrange as domésticas, a maioria não residentes, mas Shuen Ka Ung admite que essa opção poderá “criar problemas, porque os países que exportam mão de obra poderão denunciar que ela é injusta”. “Em Macau temos ainda de ponderar se o salário mínimo será ou não para todos os sectores, porque se incluirmos, por exemplo, as domésticas, cujo salário médio é de duas mil patacas, talvez não se satisfaçam algumas associações, porque irá implicar o aumento daquele valor para quatro mil ou cinco mil patacas”, observou.

Os residentes que auferem menos de quatro patacas podem requerer um subsídio de igual valor, mas os não residentes são excluídos porque “não pagam impostos e não têm o direito à residência em Macau”, justificou Shuen Ka Hung, para quem o salário mínimo “é uma situação diferente, porque será pago pelo empregador”. “A lei laboral prevê a igualdade de salários e o empregador deve cumprir esta regra”, disse quando questionado se a implementação de um salário mínimo poderá abranger os não residentes.

O salário mínimo “é um objectivo a longo prazo”, que requer ponderação para “não se dar um passo errado”, concluiu Shuen Ka Hung.

A implementação de um salário mínimo em Macau é discutida há 11 anos, mas trabalhadores e patronato não se entendem sobre a viabilidade da medida e o Executivo não avança com uma proposta legislativa antes de se alcançar um “consenso básico”. Mas a aprovação da medida em Hong Kong, em Julho, está a levar o sector laboral de Macau a pressionar o Governo e patronato.

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