A água vai dançar a partir de Setembro

Os artistas participantes estão entusiasmados com e espectáculo que Franco Dragone está a preparar no City Of Dreams. Com estreia agendada desde ontem, “The House of Dancing Water” deverá “tornar-se-á numa das maravilhas do mundo em termos de artes performativas”, prevê um dos protagonistas do elenco.

Paulo Barbosa

“The House of Dancing Water”, o muito antecipado espectáculo criado por Franco Dragone, estreia no próximo dia 16 de Setembro. O anúncio foi ontem feito por ocasião do primeiro aniversário do ‘resort’ City of Dreams, onde os artistas já se encontram a ensaiar há cerca de dois meses, depois de um longo período de preparação na Bélgica, país sede do Franco Dragone Entertainment Group.
Ficam a faltar cerca de três meses para que Macau possa ver um “espectáculo que é único, e tornar-se-á numa das maravilhas do mundo em termos de artes performativas”, considera Jesko von den Steinen, que desempenha um dos papéis principais da peça.
Frando Dragone, o director artístico e empresário de 58 anos chega a Macau depois de sucessos alcançados na Disneyland Paris e em Las Vegas, com o “Celin Dion Show”. Antes de fundar a sua empresa, Franco, um italiano criado na Bélgica e que passou boa parte da sua vida no Canadá, ganhou uma experiência valiosa trabalhando doze anos no Cirque du Soleil, onde participou na produção de espectáculos hoje internacionalizados pela companhia canadiana (casos de “Quidam” ou “Alegria”).
Os números envolvidos no novo espectáculo de Dragone são impressionantes. O “Teatro dos Sonhos”, nome dado à sala que receberá “The House of Dancing Water”, tem capacidade para receber uma audiência de 2.000 pessoas. Uma equipa de mais de 130 técnicos produziu uma peça orçamentada em 250 milhões de dólares americanos, que terá como pólo agregador uma piscina com aproximadamente 17 milhões de litros de água, alojados em 48 metros de diâmetro e oito de profundidade. Será esse o palco líquido por onde evoluirão 77 artistas vindos de 18 países, com proveniências tão diferentes como Tanzânia, Itália, EUA, Canadá, Israel ou China. Nem falta uma acrobata portuguesa.
Jesko von den Steinen é um artista de múltiplos talentos e um trabalho desenvolvido enquanto actor (nas artes circenses, desempenha frequentemente o papel de palhaço), coreógrafo, realizador e designer. Ontem, em entrevista com o PONTO FINAL, o alemão não poupou elogios à criação de Dragone. “O espectáculo é um dos mais únicos que jamais foram criados no mundo. O seu tamanho e a sua escala são imensos. Ao mesmo tempo, é também muito intimista, dada a forma como o teatro foi desenhado. Não há pilares e a audiência ficará muito próxima em relação ao palco, de forma que não há um lugar que seja mau. O espectador pode até ver o espectáculo de um ângulo e vir outra vez apreciá-lo de outro ângulo, experimentando um diferente tipo de espectáculo. É bastante impressionante”, descreveu
Especialista em teatro físico, Jesko von den Steinen diz mesmo que Macau está perante um espectáculo que não se pode perder [a ‘must see show’, na expressão inglesa] “porque combina todos os elementos, como fogo, água, terra, ar” e porque o espectador “será tocado no coração, ficará sem fôlego , ao mesmo tempo que poderá ver uma festa para os olhos, vivendo o espectáculo, que é muito intimista e, ao mesmo tempo, conta uma história muito pessoal e forte, de muitas formas diferentes”.

Narrativa simples…

Em recente entrevista a este jornal, Franco Dragone salientou que nas suas peças não são usadas palavras, nem diálogos, pelo que as narrativas são necessariamente simples. Não sendo narrativa, a linguagem principal do espectáculo é aquilo a que chama de “arquétipo emocional”. “Acredito que um recém-nascido chinês fala a mesma ‘linguagem’ que um recém-nascido na Bélgica. Eles têm todas as linguagens na sua mente e é a educação, a aculturação, que lentamente os transforma num chinês e num belga. Mas continuo a acreditar que temos esta linguagem fundamental e universal, que choramos e rimos e estamos tristes pelas mesmas razões. Acredito que, quando olhamos um pôr-do-sol, temos a mesma reacção nos nosso cérebro. Todos temos saudades de alguém, por exemplo. São estas imagens, para mim universais, que tento usar para comunicar com a audiência”, afirmou.
Ainda assim, existe uma história subjacente a todo o espectáculo, que se conta em poucas palavras. Num reino fabuloso, dominado pela magia, há um monarca com dois herdeiros. Um deles é uma bela princesa, o outro um príncipe cuja mãe é conhecida como “Rainha Serpente”. Com a morte do rei, esta tenta derrubar a princesa e fazer do seu filho o novo rei. Em desespero, presa dentro de uma gaiola, a princesa consegue libertar forças mágicas que se opõem ao mal. Na sequência de uma misteriosa tempestade, dá à costa do reino um estranho – interpretado por Jesko von den Steinen – que será o elemento salvador.

…para uma história universal

No fundo, para Jesko, trata-se de “uma história de amor”, e para a contar o coreógrafo utilizou mecanismos dramatúrgicos dos contos tradicionais chineses, contos gregos e de outros países ocidentais. Mas o protagonista do papel mais heróico da peça não considera que tenha havido uma excessiva preocupação em adaptar a narrativa ao público chinês: “Na pesquisa e exploração que Franco fez para este trabalho, investigou diferentes formas de arte, entre as quais a ópera chinesa. Teve também em conta os desportos radicais, em particular os relacionados com motos. Quando um pintor pinta com as cores que tem disponíveis, escolhe o que acha ser apropriado pintar. Penso que, no caso do Franco Dragone, não se trata de uma questão de origens culturais, do género ‘quero ter um bocadinho de influência espanhola e um bocado de australiana‘.  Quando se trata de um espectáculo que está a ser feito para o mundo, serão usados diferentes aspectos e formas artísticas. É natural que Franco tenha mergulhado profundamente nas diferentes filosofias e formas de arte chinesas. Mas não quis criar um orientalismo de ocidental que vem contar uma história sobre os chineses. Não é essa a ideia”, defende Jesko. “Essa história transcende uma cultura particular ou uma época específica. Uma das coisas que agrada a Franco é o princípio confucionista de movimento e descobriu que poderia usar este princípio como um princípio guiador do trabalho, onde estão patentes emoções diferentes, como a tristeza, alegria, amor, medo e raiva”, acrescenta.

Dimensão única…

A comparação entre “The House of Dancing Water” e as produções do Cirque du Soleil – em particular com Zaia, que é apresentado no vizinho Venetian – surge inevitavelmente. Franco Dragone foi claro, ao aduzir que comparar as dimensões dos dois espectáculos é como “comparar uma mosca com um cavalo”. “Não é algo que já tenhamos feito antes noutra parte, é único. ‘Zaia’ é um espectáculo de circo que pode ver-se em qualquer outra parte. Nós, também aí, não temos actos circenses mas performance humana. Com todo o respeito que tenho pelo Cirque, acho que a nossa abordagem é mais empática, uma abordagem de produzir tudo com o sentimento de que este ‘show’ pertence a Macau”, declarou.
Também ele com um passado muito ligado ao Cirque du Soleil, onde trabalhou muitos anos e foi personagem principal na peça “Saltimbanco”, Jesko von den Steinen encontra analogias entre as duas companhias: “Em todos os espectáculos com esta escala há semelhanças e há naturalmente uma convivialidade entre as duas companhias, que têm uma génese semelhante”.
Dito isto, tudo o resto lhe parece diferente. Enquanto a sua experiência com o Cirque du Soleil consistia na participação em espectáculos em digressão, o teatro do Cotai foi construído especificamente para receber este espectáculo. “Como um alfaiate que faz um fato encomendado, isto foi algo concebido para o público de Macau e para o complexo City of Dreams”, compara. “O que é único nesta produção é que nunca foi feita antes.”

…que os deixa boquiabertos

A concepção do espectáculo começou em 2007, e os treinos na Bélgica arrancaram em Janeiro de 2009, quando se iniciou a definição as cenas e os artistas começaram a ser contratados. Há dois meses em Macau para adaptação ao palco, os três artistas entrevistados ontem – para além de Jesko, a chinesa Faye Leung e a espanhola Ana Arroyo – são unânimes na primeira impressão que lhes causou o “Teatro dos Sonhos”. Todos ficaram “boquiabertos”.
Louvando o trabalho das pessoas “que estão há mais de dois anos a trabalhar para fazer do teatro uma realidade”, o multifacetado Jesko diz que a água é quase como se fosse parte do elenco. ”Pode imaginar um teatro onde vê uma grande quantidade de água. Isso não é vulgar e é o que torna este espectáculo muito único. Há também cerca de 258 fontes e jactos de água, e esta vai literalmente dançar. A água acaba também por ser uma personagem, como o próprio teatro. A sofisticação técnica deste teatro vai fazer parecer que a água tem vida. Temos um novo parceiro, a água”, descreve.
No dia 16 de Setembro, “tudo estará pronto de certeza”, antevê o alemão. Mas tudo continuará em mudança, explica: “Quando o espectáculo inaugura, está funcional. Mas continua sempre a desenvolver-se e a mudar, tal como um organismo vivo. Portanto, o espectáculo estará pronto, mas não acabado. Porque nunca acaba. Está sempre em desenvolvimento e sempre a crescer. Essa é beleza de um espectáculo ao vivo.”

CAIXA

Uns de regresso, outros em estreia

Para Jesko von den Steinen, Macau é um regresso, embora desta vez de forma mais permanente, pois não se sabe quanto tempo a criação de Dragone se manterá em palco. O alemão veio à RAEM em 2006, para participar no Festival de Artes de Macau e voltou já com a Dragone Entertainment, para a abertura do Crown. Ao longo das visitas, considera “muito interessante observar a mudança que se deu nos últimos quatro ou cinco anos”. E recorda-se de “não haver nada” no local de implantação do complexo do City of Dreams, “onde agora há hotéis e recintos para espectáculos”
Natural de Xangai, a bailarina Faye Leung, que teve de aprender a nadar para participar na peça, está muito ligada ao ballet clássico e trabalhou vários anos numa companhia de Hong Kong. Uma das últimas a entrar no elenco (em Fevereiro), Faye fez a sua estreia em Macau com uma companhia de ballet no Centro Cultural e confessa que “sabe um pouco” sobre o território. Habituada a paragens orientais – já trabalhou em Xangai, Pequim e Hong Kong – a espanhola Ana Arroyo está pela primeira vez em Macau e pretende ”descobrir mais coisas” sobre a história latina da região.

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