Candidata pró-democrata resigna

170909A número quatro da lista liderada por Au Kam San abandonou ontem a corrida à Assembleia Legislativa, depois de ter sabido pela imprensa da sua condenação a três anos e meio de prisão, por fraude. A Associação Novo Macau Democrático tem receio das consequências que o incidente poderá ter nas suas ambições eleitorais. E não deixa de estranhar o episódio.

Paulo Barbosa

O encontro com os jornalistas promovido conjuntamente pelas listas de Ng Kuok Cheong, da Associação de Próspero Macau Democrático (lista 4) e de Au Kam Sam, da Associação de Novo Macau Democrático (lista 15) tinha como tema a habitação social. Mas o incidente que rebentara umas horas antes, na manhã de ontem, acabou por concentrar todas as atenções. Presente na mesa, Ng Seng Fong, a número quatro da lista de Au Kam Sam, declarou que vai abandonar a corrida às legislativas de Macau, depois de saber pela imprensa chinesa que tinha sido condenada em Julho a uma pena de três anos de prisão.
Depois de, na véspera, os dados sobre o caso terem sido colocados na Internet, a imprensa em língua chinesa do território deu conta que a candidata tinha sido condenada a três anos e três meses de prisão por ter falsificado carimbos e tentado convencer pessoas a realizarem investimentos falsos, sentença que a visada alega desconhecer.
O caso remonta a 2005, quando um ex-namorado de Ng Seng Fong, uma empresária do sector logístico com actividade na RAEM e no interior da China, apresentou uma queixa contra a mesma, tendo-lhe depois alegadamente dito que tinha retirado a acusação.
Numa declaração dramática, Ng Seng Fong chegou a chorar quando se justificava perante os jornalistas. Esta manhã, mal soube da decisão judicial, a candidata resignante terá ido ao tribunal para apresentar recurso. Ng Seng Fong diz-se inocente de todas as acusações. “Vou-me retirar da lista, como um acto de responsabilidade para com a associação e a sociedade”, declarou.
Ng Seng Fong alega ter acreditado no antigo companheiro, ao salientar que não se apercebeu que a justiça tinha dado continuidade ao caso, garantindo que nunca foi notificada para comparecer em julgamento e que só soube esta semana pela imprensa da existência de uma sentença, embora esta já tivesse sido lavrada há dois meses.
A publicitação da condenação em pleno período eleitoral foi apelidada de “muito conveniente” por Chiang Meng Hin, outro dos candidatos da lista de Au Kam Sam: “Os documentos não foram parar sozinhos à Internet, os documentos confidenciais da Polícia Judiciária também não [ver caixa], portanto isto foi feito por alguém, mas não queremos acusar ninguém, nem inventar nenhum plano.”
Chiang Meng Hin disse mesmo não acreditar em tamanha coincidência, frisando que a ré “não teve hipótese de se defender em tribunal”. O candidato insinuou por diversas vezes que o caso está a ser aproveitado politicamente. “Por que motivo o caso foi tornado público apenas agora?” – questionou, acrescentando que “o filho do ex-namorado de Ng Seng Fong trabalha na Polícia Judiciária”.
Residente em Zhuhai, Ng Seng Fong percorre todos os dias a fronteira das Portas do Cerco, pelo que os membros da Associação de Novo Macau Democrático (ANMD) estranham a inacção por parte do departamento de emigração, que, segundo Chiang Meng Hin, “nunca fez nada para a notificar” ou para a fazer comparecer em julgamento. Segundo o candidato da lista de Au Kam Sam, a candidata que está no centro da polémica “não sabia que o caso só poderia encerrar-se após julgamento em tribunal”.
Embora os responsáveis pela candidatura tenham negado qualquer conhecimento do processo judicial que envolve Ng Seng Fong, também consideraram que “ser acusado não é uma razão suficiente para excluir alguém da candidatura”, embora os estatutos da ANMD prevejam que “ninguém que tenha cometido um crime pode ser membro”.
A ANMD concorre este ano às legislativas com duas listas, com o objectivo de eleger quatro deputados, depois de em 2005 ter obtido a melhor votação, com cerca de 23 mil votos, mas agora teme o impacto deste caso nos resultados finais. O mandatário da campanha afirmou que o caso de Ng Seng Fong deve servir de exemplo para a formação das futuras listas da ANMD. “No futuro teremos mais cuidado com a verificação do background dos candidatos”. Para Andrew Cheong, as consequências do caso poderão ter um reflexo na votação do próximo domingo. “Estamos assustados, porque sabemos que alguns jornais vão tentar exagerar este caso, mas esperamos que a nossa explicação possa esclarecer as dúvidas dos cidadãos e que os nossos apoiantes nos dêem o seu voto de confiança”, argumentou.

Mais habitação social

Para além da tentativa de esclarecer a polémica, a ANMD convocou os jornalistas para criticar a política de habitação social seguida pelo governo de Edmund Ho. Para Au Kam Sam, num cenário de encarecimento da habitação, não é admissível que “o plano da habitação social tenha sido suspenso”. O deputado recordou que, no fim de 2005, o Chefe do Executivo prometeu implementar o plano da habitação social “3456”. No seu âmbito, deveriam estar construídos seis mil fogos de habitação social até ao fim de 2010. “No entanto, os primeiros três anos passaram e só existem 210 apartamentos feitos”, denunciou.
Nem mesmo a divulgação governamental do plano de construção de 19 mil apartamentos de habitação social em Coloane, até 2012, convence o candidato. “A ideia é bem-vinda, mas serão todos feitos até 2012?” – questionou.
Para o cabeça de lista é preciso construir mais, pois mesmo os 19 mil fogos só servirão para “satisfazer as exigências que existiram há 8 anos”. Por isso, propõe a planificação de mais habitações sociais e não uma política habitacional onde “apenas um terço dos recursos existentes são usados na habitação social e 70 por cento dos terrenos são reservados para a habitação privada e as casas de luxo”. Alegando a “necessidade da sociedade e a voz dos habitantes”, Au Kam Sam perguntou mesmo “se o governo pondera o uso social de todos os terrenos disponíveis destinados à construção de habitações”.

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